segunda-feira, 1 de agosto de 2011

O cachorrinho riu para a moça mais linda da cidade - 11

A semana começou desinteressante dentro da vidinha besta que eu estava levando, achei sentido dando um passeio pelo cineclube para assistir Rocco e seus Irmãos, de Visconti; durante o filme só pensava em Carla e como seria estar com ela no final de semana, de repente uma loucura a três. Havia entre o filme visto e a expectativa do que rolaria até domingo um recheio de amargura, envolvido nesse recheio voltei pra o meu canto e retomei o velho romance repleto de pó.
Segunda, virado à paulista, terça, bratiola, na quarta, Arnaldo apareceu para uma feijuca na faixa, terno alaranjado, a gostosa e a velhota ao lado, comeu feito um desgraçado, bebeu duas batidinhas, uma cerveja e as meninas ao seu lado, um filé de frango grelhado com legumes cada uma. “O negócio é o seguinte”, ele me disse quando fui recolher os restos sobre a mesa, “o Bigode aceita vender para o Zelão em quinze vezes assim, assim, a grana tem que ser depositada na conta da Matilde, ele manda lembranças e diz que sente saudades, eu tenho procuração e posso assinar toda a coisa”. Chamamos o Zelão que, diante da proposta, marejou os olhos, beijou o pequeno São Judas Tadeu pendurado em volta do pescoço e aceitou de pronto, dando-me um abraço caloroso como se eu fosse da família, quase chorei vendo a felicidade daquele nordestino parrudo que viera para São Paulo, como tantos outros, para fugir das agruras de seu local de nascimento, largando para trás a mãe, o pai e os irmãos.
Quanta coisa de repente aconteceu num curto intervalo de tempo, como as coisas se transformam sem que possamos perceber, me sentia feliz pelo rumo novo que tomava a vida do bom Zelão, por outro lado, descia mais uma vez a minha ladeira do tempo, repleto, feito adolescente, de expectativa por um abraço, porra, acho que a coisa que procurava era apenas um abraço, que estúpido babaca eu era, de qualquer forma se eu não havia feito nada em causa própria ao menos um companheiro encontrara motivo para viver melhor. Naquele dia, olhei o bilhete da Vânia onde ela havia rabiscado o local de sua despedida, dentro de quinze dias a veria pela última vez e, para piorar, fui perceber que o local era em Guararema, precisava avisar o Zelão e descolar uma carona, mas, antes de qualquer coisa, fui ao Jaburu ouvir o velho tocar uma viola clássica, onde beberiquei algumas cachaças de cravo, entre cervejas e porções de carne seca, falei com Jabá sobre a música de Caetano, de quem ele era grande fã e que eu sempre achei chatinho, comemorei a vitória do outro e esse outro que raio tinha feito para comemorar a aquisição do lugar? Jamais perguntei para o Zelão sobre isso.
A semana rolou no final das contas de forma tranquila, todo o lance do Zelão me fez esquecer do passeio do domingo, peguei uma quentinha com sobras de feijoada, uma garrafa de vinho e fui para a minha mansão no sábado à noite, comi, bebi e fiquei me esforçando, buscando inspiração para escrever e a tal inspiração não apareceu, rabisquei uma coisa e outra, mas nada muito interessante.
 - Tem gente chamando você. - Alhos, bugalhos, chegaram antes da hora marcada e, Caracas, La Paz, Santiago, o relógio tinha parado, passei a noite em claro, tentando escrever algo.
- Avise que já estou indo, Dona Maria. - Reli o que havia escrito, achei um lixo, amassei a folha e joguei fora. Me vesti e fui encontrá-las para a macarronada do domingo.

Um comentário: