sexta-feira, 31 de maio de 2013

Juizo final - 1

Nu, percorrendo pequeno espaço. Aquela casa. Na memória o mamilo na boca. O tempo se diluindo na fina areia da ampulheta, pode se inverter o objeto, mas é impossível recuperar o segundo que passou. Aquele negro lindo fazia tudo se transformar nesse limite do nada, quando de suas mãos arremessava a bola laranja, era o instante mágico, a viagem até o chuá, a linha tenue clara feito o sorriso da criança. Passava pela cabeça um dia sem nada. O vazio da existência era o furo por onde saia toda a sua devassidão. Estreito corpo de homem comum, cidadão acima de qualquer suspeita, um biltre, a pessoa que fez alterar o rumo de vidas, o cara que deixou para trás gente de todos os credos, ele que não tinha religião nenhuma, que sempre teve como pátria a nação dos expatriados. Era necessário ter morrido primeiro, a cada féretro a morte lenta no descer da madeira para o lixo da incompreensão. As cinzas tantas vezes atiradas ao mar, certa vez colocou os restos do irmão numa garrafa de cachaça e lançou pelas águas salgadas onde ele jamais velejou, o caminho até o infinito onde poderia encontrar os orixás, onde poderia ser feliz pelo menos uma vez, se é que existe felicidade em saber que as coisas que se ama ficam por aqui, se é que possível ter a exata medida de que algum canalha vai trepar com a pessoa com que se dormiu por anos, que se amou e ama mesmo confinado numa garrafa ou num retrato guardado dentro de um álbum no armário. Descalços pés, frio chão, cidade que não para nem mesmo quando se grita no meio da tarde. Antes de qualquer estado como este, ele já esteve entre as cabeças nem tanto privilegiadas mas, de grandes cabeças e enfiava até a o talo para que o vissem, hoje, no silêncio ele não consegue fugir de si mesmo, não era possível escapar do remédio para a pressão, nem para o ácido úrico tão pouco de nosso senhor de porra nenhuma. Pensava em todos e sorria com o canto da boca.  

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